Por Equipo de Redacción
Publicado em 28 de julho de 2021
Desde que assumiu o posto de CEO, logo após a empresa abrir o capital, a executiva já liderou 17 aquisições — e vem pavimentando o caminho para a Ambipar se tornar referência mundial em gestão ambiental. Para ela, o desafio é dar aos resíduos um destino economicamente viável.
Fundada em 1995 por Tercio Borlenghi Neto, em Nova Odessa (SP), a empresa de gestão ambiental Ambipar levantou a respeitável cifra de R$ 1,1 bilhão em seu IPO, há um ano. “Surpreendemos o mercado que nem sequer sabia que no Brasil havia uma empresa tão preparada para atuar neste segmento”, afirmou a CEO Cristina Andriotti. Para ela, o sucesso do negócio se deve à conexão visceral com as boas práticas da economia verde.
DINHEIRO – Em julho de 2020, a Ambipar estreou na B3 precificada no topo da faixa indicativa, R$ 24,75. Em um ano, a valorização superou 70%. Que fatores explicam a boa aceitação do mercado?
CRISTINA ANDRIOTTI — Nosso modelo de negócio. Ainda que no momento do IPO o assunto de gestão do resíduo no Brasil fosse incipiente, fora daqui a valorização do lixo já era tema relevante. A proposta da nossa vertical Envi-ronment, de não ser apenas uma gestora de resíduos e sim de criar valor para o lixo, transformando-o em novos produtos dentro de uma economia circular, é um dos fatores que fizeram brilhar os olhos dos investidores. A vertica Response, focada no gerenciamento de crises e no atendimento de emergências ambientais, químicas e biológicas, tem grande potencial de internacionalização.
O lucro líquido da Ambipar no primeiro trimestre ficou 195,7% acima do que o apurado no mesmo período do ano passado. O que impulsionou esse resultado?
Crescemos bastante. A receita quase dobrou [alta de 83,9%, para R$ 262,3 milhões], com melhoria de margens tanto de Ebitda [alta de 80,7%] como de margem líquida [27,7%], resultado de uma estratégia de crescimento ancorada em aquisições.
Foram 17 em um ano. Por que tantas?
A tese que apresentamos aos investidores era usar o capital para crescer por aquisições com foco na vertical Response e dentro de um processo de internacionalização. No Brasil, nosso crescimento seria prioritariamente orgânico com a Environment, mas sem perder de vista nenhuma oportunidade. Então, fizemos aquisições por aqui também, com foco na ampliação de portfólio.
A estratégia de compras vai continuar?
Vamos superar as metas que estabelecemos juntos aos investidores. Temos um time de especialistas focados em aquisições, sobretudo fora do Brasil.
Quais segmentos vocês estão mirando para expansão?
Fora do Brasil vamos continuar olhando para a vertical Response. Nos Estados Unidos esse mercado é muito pulverizado. A maior empresa americana nessa frente é focada somente em trazer o resíduo da emergência para dentro do seu aterro e ela só tem 2% do mercado. Hoje já atuamos em dez estados norte-americanos. Em alguns, como Texas, já começamos a crescer organicamente. Nossa ideia é acompanharmos toda a rota do químico no mercado estadunidense.
No Brasil, qual estratégia de crescimento?
Em Response já somos líderes, mas estamos aumentando nossa penetração em estados que não tínhamos base. Também queremos crescer organicamente levando serviços agendados para a indústria de químicos e estamos com uma divisão encarregada de prospectar atendimentos nas concessionárias de rodovias, para que a Ambipar seja a primeira a ser chamada em caso de acidentes com químicos, grãos ou outros materiais.
E na Environment?
Recentemente adquirimos a AFC, empresa de gerenciamento de resíduos industriais no Nordeste, que era um mercado que não tinha acesso a soluções ambientais como no Sul e Sudeste. Além disso, estamos expandindo nosso leque. Antes ficávamos só nas grandes empresas. Hoje queremos crescer também nas médias e pequenas. Vale dizer que esse tamanho não se refere só ao valor financeiro da empresa — e sim ao volume de resíduos gerados.
Há uma mudança substancial na gestão de resíduos nas empresas?
A bandeira da valorização do lixo e da economia circular já foi levantada no Brasil e todas as indústrias estão preocupadas com essa agenda. Hoje atuamos em todos os resíduos, mas para alguns deles ainda é preciso criar uma estratégia de valorização e aí sim fechar o ciclo da economia circular.
Quão desafiador é fazer economia circular com a estrutura que temos no Brasil?
O governo precisa se estruturar para dar soluções sustentáveis para o lixo urbano. Essa pressão virá da sociedade. Entre nossos clientes, e não atuamos com governo, eu diria que já existe uma consciência a respeito da urgência de solucionar este problema.
Vocês atuam na gestão do pós-consumo?
Sim, mas dentro do âmbito do mercado privado. Inclusive fortalecemos nossa atuação nesse segmento com a aquisição da Boomera, que trabalha em parceria com catadores e cooperativas para a compra de resíduos plásticos, transformando-o em resina para a indústria química.
É possível estimar o fluxo de dinheiro envolvido no mercado de valorização de resíduos?
Esse é um número que desconheço. Mas, entre nossos clientes do segmento de papel e celulose, já conseguimos valorizar 98% dos resíduos gerados por eles. Somente 2% dos resíduos vão para o aterro sanitário. Lixo é dinheiro.
E para quem vai a receita obtida com o lixo?
Depende. Temos contratos em que compartilhamos a receita com o cliente, em outros ficamos com ela e há aqueles em que é usada como um abate do nosso contrato mensal. A solução tem que ser rentável.
Há algum resíduo especialmente desafiador no processo de economia circular?
Os resíduos de papel e celulose foram especialmente desafiadores. Com alto teor de minerais e muito volume, foi difícil encontrar uma solução para reintroduzi-lo no setor produtivo. Mas conseguimos desenvolver uma solução junto à indústria de cimentos para usá-los na produção de mourão e de sub-base de asfalto. Isso foi tão relevante que uma empresa da Finlândia nos procurou para estudarmos o desenvolvimento de algo nessa mesma linha.
E o custo de um processo como esse?
Nosso grande desafio é que toda a valorização pare em pé e que seja economicamente viável para o cliente. Não adianta apresentar uma solução que custe milhões.
Há alguma indústria em que a gestão de resíduos não seja satisfatória?
Eu diria que o corte não é por indústria. As multinacionais, ainda que não tenham chegado à solução para o problema, estão focadas em buscá-la. No Norte e Nordeste o engajamento com a circularidade do lixo é muito baixa por falta de acesso à tecnologia. Acredito que vamos mudar esse cenário.
A vertical de atendimento de emergências, a Response, tem demanda mais distribuída?
Temos uma legislação muito forte e atuante no setor químico. A indústria tem uma corresponsabilidade grande com o transportador. Quem não obedece à legislação está sujeito a multas pesadas. São Paulo foi o primeiro estado a determinar que todo transportador químico deva ter um contrato com uma empresa de resposta de emergência para agir em caso de acidente. Agora a prática está se alastrando.
O Brasil, de forma geral, passa por um processo de desmanche nos órgãos ambientais. A Ambipar sentiu algum impacto?
Dentro do processo de legislações e dos processos de controles de transporte químico e petroquímico não sentimos nenhum impacto. A lei e fiscalização são rigorosas.
Já a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) tem enfrentado críticas com diversos agentes pedindo sua modernização. Como vocês a avaliam?
A sociedade está se conscientizando com relação à geração de lixo e vai pressionar por uma evolução da agenda no Brasil. A PNRS, certamente, será revista em breve.
Parece muito otimismo diante de uma sociedade que não se preocupa com o lixo…
O Brasil tem dimensões continentais. No Sul e Sudeste a consciência é maior que nas outras regiões. Como disse, o Norte e Nordeste nem sequer tinham acesso à tecnologia de economia circular para os resíduos. Na medida em que isso acontecer, o comportamento mudará. Vamos nos tornar um país de primeiro mundo na agenda ambiental.
Quais seriam os grandes desafios no Brasil para dar mais escala para a economia circular de resíduos?
A logística reversa é o movimento mais complexo e mais difícil. Mesmo com postos de coleta, desconto para quem devolver embalagens, ainda não conseguimos a resposta de como fazer isso funcionar adequadamente.
Na sua visão, o Brasil tem condições de ser uma potência ambiental. Mas enfrentamos problemas como desmatamento, crimes ambientais, falta de fiscalização. Qual sua avaliação do ESG no Brasil?
Não vou falar do ESG no Brasil. Mas falo pela Ambipar e sobre os nossos clientes. Essa é uma agenda que veio para ficar. Quem não colocar a agenda ESG como prioridade no seu dia adia, seja um país ou uma indústria, terá um futuro incerto.